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Vaiêshev - Gênesis 37:1-40:23

Mais uma parashá rica em histórias, contos familiares, ciúmes e armações. Iossef sonha, conta para seus irmãos, por quem quase é morto, mas acaba vendido como escravo e vai parar no Egito. Lá ele se torna escravo de Potifar, cuja esposa se atrai por Iossef, e causa a prisão dele diante da recusa dele em saciar as vontades dela. Na prisão ele mais uma vez se encontra diante de um par de sonhos, os quais decifra com ajuda divina.


Nesta parashá, como na anterior, encontramos uma história encapsulada em que uma personagem feminina é central. Aqui Tamar é tomada como esposa do filho mais velho de Judá, que morre sem deixar descendência; o segundo filho de Judá é indicado para cumprir o dever de levirato, mas ele evita engravidar Tamar, e acaba também morrendo. Judá então devolve Tamar à casa de seu pai, para lá ficar como viúva até que o filho mais novo de Judá tenha idade para se casar, mas, como explica Rashi, “ele nunca teve a intenção de dá-la a ele em casamento”. O menino cresce e o casamento não acontece. Tamar fica sabendo e toma o destino em suas mãos: tira suas roupas de viúva, coloca um véu e fica na porta da cidade, por onde Judá passa, a toma por prostituta e se deita com ela, deixando seu selo como depósito para o pagamento que enviará depois. Tamar engravida, e Judá descobre, finalmente, que se deitou com a própria nora. Tamar tem gêmeos, e de Perez, seu filho, descende o rei David.


Como aponta a acadêmica Lesleigh Cushing Stahlberg, “Duas vezes no ciclo de Jacó em Gênesis, encontramos uma história independente de um capítulo sobre uma mulher: Dina e Tamar. As histórias quase nunca são lidas juntas, apesar de sua proximidade textual e das claras conexões temáticas e idiomáticas entre elas. Assim como Dina, Tamar é uma mulher que se encontra em uma posição vulnerável fora da casa de seu pai. Como Dina, ela tem sexo não autorizado. A história de Dina é uma história de estupro e massacre, a história de uma mulher silenciada mesmo quando ela é aparentemente redimida. Dina não age; ela é levada a efeito. Em contraste, Tamar fala, ela age, ela pensa, ela conspira, ela desafia.”


Tamar entende sua posição dentro de sua sociedade, percebe que está sendo deixada vulnerável e não aceita o destino que lhe é imposto. Ela joga com as armas que tem, mostrando a importância da ação, da escolha. Ela é astuta ao lidar com Judá, mas ao mesmo tempo se coloca em um lugar de risco muito grande, mostrando também sua coragem. Stahlberg sugere que a história de Tamar serve quase como uma correção textual à história de Dina, que tem sua voz e ação tolhidas pelos homens que a cercam.


“A história de Tamar é uma investigação sobre a ação e identidade das mulheres. Depois de ter sido definida por suas relações com outros homens, presa como "viúva na casa de seu pai", Tamar subverte seu status de objeto passivo para o sexo ao reivindicar o papel de uma prostituta. À primeira vista, esta narrativa parece difamar a prostituição de Tamar, mas olhando mais de perto, ela celebra a força de suas ações e critica a tolice de Judá. Com sua própria inteligência, Tamar inverte as estruturas de poder entre homens e mulheres. Ela deixa de ser comandada, atendida e desviada por seu sogro para despojá-lo de sua própria identidade e se redimir. Embora essas manobras ocorram sob regras patriarcais, e talvez para um fim patriarcal, a audácia e protagonismo de Tamar definem sua história como indiscutivelmente feminista.” Propõe Ananya Malhotra aluna da cadeira de Igualdade de Gênero na Universidade de Princetown.


Tamar nos mostra que podemos usar nossa inteligência e capacidade de ação para subverter situações às quais somos sujeitas. Que é possível utilizar a nosso favor as mesmas armas que são usadas para nos calar. Principalmente, somos apresentadas à ideia de que, ao tomar voz e ação, somos recompensadas, uma fagulha de endosso do texto bíblico à ação feminina.


Sejamos Tamar. Sejamos voz, ação e luta.


Shabat Shalom.

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