top of page

Vaishlach

Dina, #MeToo


Uma menina está no ponto de ônibus esperando, quando um homem adulto “passa a mão” dela. Uma adolescente tem sua foto nua enviada a todos os meninos da escola. Uma moça sente um homem “se encaixar” nela em um ônibus lotado. Um professor força um beijo em uma aluna. Um chefe se insinua para sua estagiária ou funcionária júnior. Um cliente fala sobre o corpo de uma prestadora de serviços. Um homem agarra uma mulher pela cintura em uma festa e diz que gostaria de “pegar ela”. Uma mulher é violentada após uma festa.


Dina, filha de Lea, sai de casa para olhar as outras meninas da vizinhança, mas é vista pelo príncipe local que a pega, deita com ela e a humilha. A palavra em hebraico é ina (יענה) que também significa violar. Dina não volta para a casa de sua família, é mantida na casa de Shechem. Dina não tem voz nesta parashá. Sua única ação foi sair.


De acordo com Rashi, Dina saiu de casa porque era filha de Lea, tal “mãe tal filha” diz o sábio, em uma alusão à culpabilidade da vítima por seu estupro. Afinal, se tivesse ficado em casa tomando conta de seus afazeres, nada teria acontecido.


Quantas vezes, nos dias de hoje, ouvimos comentários do tipo: “mas o que ela estava vestindo?” “Por que ela estava lá sozinha?”. Toda mulher que já sofreu algum tipo de assédio se perguntou após a agressão o que ela fez para que algo como aquilo acontecesse, quando na realidade o fato nunca deveria acontecer independente da roupa, da atitude ou do local em que a mulher está.


Dina era uma menina, de acordo com a Torá. Mas a sua voz, seu sentimento e suas dores são ignoradas tanto pelo texto bíblico como pelos sábios rabinos que sucederam o texto. Na visão patriarcal de nossa tradição, os irmãos e o pai são o centro das preocupações e da narrativa. Iaacov, seu pai, ao ouvir sobre o estupro de Dina não faz nada, espera seus filhos chegarem. Dina é só mais uma menina que se torna mulher à força e é dissipada.


O que aconteceu com Dina após ter sido estuprada, exposta e humilhada, não importa para a narrativa bíblica. Dina desaparece. Aquelas mulheres do primeiro parágrafo, somos todas nós.

1 visualização0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Komentáře


bottom of page