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Shacharit de Pessach

Bom dia, iniciamos a cerimônia de shacharit da festa de Pessach – Chag haPessach, Chag haMatsót ou Chag haAviv. A festa que celebra a liberdade, em que comemos matsot e lembramos das argruras pelas quais passaram nossos antepassados, mas também a festa da primavera, e com ela a esperança de renovação.


Neste serviço, continuamos nossa travessia, continuamos nossa mitsvá de lembrar, contar, e agradecer o fato de estarmos livres e juntos, hoje, aqui.


Como não poderia deixar de ser, o trecho que lemos hoje da Torá[i] trata da história de Pessach. O trecho escolhido pelos nossos sábios é o ápice da história da libertação, um recorte perfeito daquilo que é importante lembrar neste chag.


Lemos sobre o abate do cordeiro, o sangue colocado nos batentes das portas para proteger as casas dos bnei Israel, lembramos a morte dos primogênitos, lembramos a profunda dor dos egípcios – houve um forte choro, porque não havia uma casa em que não tivesse havido uma morte – a correria e bagunça da saída às pressas da terra. Principalmente, somos lembrados de contar aos nossos filhos, e de lembrar através dos tempos, da história de quando Deus nos tirou do Egito com mãos fortes e braços estendidos. No maftir, lemos as regras para o sacrifício que era oferecido em Pessach.


Para mim, a perfeição da escolha deste trecho reside no fato de nossos sábios não terem decidido esconder as partes duras desta história. A leitura da Torá conta a história dura do dia em que fomos presenteados com a liberdade: morte, furto, dor, desespero, correria.


Sobre a morte dos primogênitos, o comentarista francês do século 13, Chizkuni[ii], fala de como a Torá descreve um estado de espírito, tanto o faraó quanto seus conselheiros estavam como que cegos pelo choque, acordados à noite. Sobre os objetos que os israelitas “emprestaram” dos egípcios, lemos na obra do século XVIII Or haHayim[iii] que havia um incômodo em tirar os bens dos egípcios, e que os israelitas só o fizeram porque era uma orde de Moshé. Percebemos, assim, ao ler os comentaristas clássicos da Torá, que há um desconforto com partes do trecho que lemos, porque a verdade pode ser dura e difícil de lidar. Então, em sua maneira de olhar o texto bíblico, eles encontram maneiras de suavizar a dura realidade que o texto nos traz.


No entanto, a musicista americana Ellen Allard[iv] sugere um paralelo com a educação de filhos: “Parenting tem tudo a ver com manter sua palavra, tanto em situações positivas quanto negativas. Quer prometamos um agrado por algo bem feito ou uma consequência por mau comportamento, a maneira como seguimos adiante é uma lição importante para nossos filhos.”[v] Tenho aqui em casa um acordo com meus filhos, de sempre respondermos a verdade uns aos outros quando diretamente perguntados sobre um assunto. Quem responde a verdade não é punido por ela. Um acordo que às vezes é difícil para ambos os lados, mas que é muito importante para nossa segurança. Com este acordo, tenho certeza de que meus filhos vão me contar a verdade nas mais difíceis situações, e eles sabem que podem contar comigo, sem bronca ou cara feia quando estiverem em alguma situação complicada. Da mesma forma, eles sabem que sempre ouvirão a verdade de mim.


A verdade traz em si uma complexidade de sentimentos que muitas vezes é difícil de ser acessada. Nos faz reviver decisões pobres, talvez moralmente incorretas – como tirar objetos dos egípcios, dores profundas – como gerar a morte dos filhos e pais das famílias egípcias. Mas por mais difícil que seja a verdade com a qual estamos lidando, é muito mais rico e saudável lidar com a verdade pura, do que com os floreios que inventamos para suportar a emoção que ela nos traz. A verdade traz algo bom em si, como define o dicionário Michaelis[vi]: “Procedimento franco e sincero ou boas intenções; boa-fé”


A leitura da parashá escolhida especialmente para Pessach traz em si a lição de que a liberdade está atrelada à verdade. De que é preciso enxergar toda a complexidade de fatos e emoções que a narrativa nos apresenta, e na riqueza deste tecido complexo aprender e ensinar aos nossos filhos.


[i] Exodo 12:21-51, Números 28:16-25 [ii] ויקם פרעה לילה, “Pharaoh arose during the night;” the word לילה here describes a state of mind, both he and his advisors were as if blindfolded with shock. [iii] https://www.sefaria.org/Exodus.12.35?lang=bi&with=Or%20HaChaim&lang2=en [iv] https://ellenallard.com/about/ [v] https://reformjudaism.org/learning/torah-study/torah-commentary/bo-tots-importance-keeping-our-promises [vi] https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/verdade/

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