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Religiosidade e futuro

A eterna pergunta das comunidades e, em especial, das famílias judias é se nossos jovens, ou filhos continuarão a ser judeus. Como mãe, confesso que não sou diferente, claro que me preocupo com a questão.


Há alguns dias participei de um encontro em um coletivo feminista da escola dos meus filhos. Fui convidada a falar sobre Feminismo e Judaísmo, mas a conversa, entre perguntas e respostas, acabou flutuando por diversas áreas do judaísmo e da prática judaica. Uma das jovens então me contou que, para ela, judaísmo era comer na casa da avó no shabat e nos chaguim, e ela me perguntou se esta era uma opção válida.


Já adianto que minha resposta foi sim. Seria o judaísmo religião, cultura, povo, ou todas as anteriores? Minha resposta permeia o conceito que eu acredito do que seja “religião”.


Citando a acadêmica norte-americana Rachel Gross “Apesar dos melhores esforços dos pensadores judeus para separar os aspectos religiosos e culturais da prática judaica, estes limites nunca foram claros. Os entendimentos tradicionais de “religião” repousam desconfortavelmente com as realidades judaicas que têm um foco maior nas práticas ... entender as práticas dos judeus exige que empreguemos uma definição mais ampla de religião.” Assim, “religião é melhor entendida como relacionamentos significativos e as práticas, narrativas e emoções que criam e apoiam esses relacionamentos.”[i] Religião, então seria o que importa na vida, ações e relações que suportam aquilo que é mais importante para cada um.


Ou, nas palavras do filósofo judeu Martin Buber “A verdadeira comunhão do homem com Deus ocorre no mundo. Deus fala ao homem nas coisas e nos seres que envia em vida, e o homem responde com a sua ação, precisamente em relação a essas coisas e a esses seres.” O que nós entendemos como religiosidade, de acordo com Buber, está no verdadeiro encontro, na troca, entre pessoas que permeiam a nossa vida, e nas ações que tomamos por conta destas relações.


Entender a religião como relacionamentos torna nossas interações com nossas famílias, nossas conexões com as comunidades e as narrativas que usamos para explicar nosso lugar no mundo centrais para a atividade religiosa. Isso nos permite ver a religião judaica em uma variedade de práticas e em locais inesperados, mesmo que seus praticantes não se identifiquem como “religiosos”.


Buber sustenta que o maior perigo do homem é a religião. Mas não a religião como prática interativa entre pessoas, busca de significado e suporte emocional para a vida, mas como instituição engessada e fossilizada. “A preparação renovada e consagrada para a comunhão com Deus e com o mundo” é o que dá significado à relação do humano com Deus.


A última pesquisa do Pew Research Center[ii] sobre a população judaica norte-americana revelou que quase nove em cada dez adultos que foram criados como judeus (88%) ainda são judeus hoje. Isso inclui 18% que não se identificam com nenhuma religião, mas que se consideram judeus de alguma outra forma, como cultural, étnica ou de origem familiar.


“Algumas coisas mudam e outras não. Os judeus continuam a encontrar significado nas conexões emocionais com suas famílias, comunidades e histórias, embora a maneira como o fazem continue a mudar. Expandir nossa definição de "religião" pode nos ajudar a reconhecer melhor as maneiras como eles estão fazendo isso” prega Rachel Gross.


Nos desvincularmos da noção rígida de como praticar o judaísmo, talvez nos garanta tranquilidade em relação às gerações futuras. Meu filho está na faculdade, longe de casa. Esta semana ele decidiu cozinhar para alguns amigos e escolheu fazer shakshuka para eles. De todas as possibilidades, ele escolheu uma receita israelense para preparar e compartilhar. Então, eu fico tranquila: o coração dele e tudo o que é importante, circula em torno da identidade judaica dele, mesmo que ele não tenha a menor intenção de fazer daquele momento uma experiência judaica.


O futuro do judaísmo está garantido, uma vez que entendamos que a religião judaica vai muito além da prática religiosa sinagogal, mas também reside na leitura, na música, nos filmes, nas comidas, no que trazemos de judaico para o nosso dia a dia. Sejamos judeus religiosos em todos os dias e todos os momentos de nossas vidas. Que saibamos enxergar a religiosidade nas relações e nos pequenos atos cotidianos de nossas vidas.


Shabat Shalom.


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