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Parashat Tazria - Vaicrá 12:1 – 13:59

Na porção da Torá desta semana, Tazria, Deus instrui Moshé sobre os rituais de purificação para as mães após o parto. Deus então descreve a Moshé e Aharon os procedimentos para identificar a tsarat e quais os procedimentos a serem tomados com relação às pessoas, tecidos e casas afetados por esta descamação.


Tazria é uma parashá que relaciona experiências corporais e espirituais através da pureza ritual. Para além da misteriosa doença de pele chamada tsarat, o questionamento que ficou profundamente marcado em minha leitura desta semana foi a relação entre nascimento e impureza. De acordo com Tazria, dois níveis diferentes de impureza acometem a mulher que “dá semente”, ou seja, concebe e dá à luz uma criança. O primeiro nível é comparado à impureza da menstruação, enquanto o segundo nível traz uma impureza menos severa, que impede a mulher somente de estar no Templo, mas permitindo que ela reassuma suas atividades diárias. Este segundo nível é descrito no texto bíblico como “tishev bidmei tohora” ou se sentará no sangue de tohora (palavra que eu aqui prefiro não traduzir).


“O termo “sangue de tohora”, é frequentemente entendido como marcador do período de tempo em que a mulher gradualmente passa da impureza ritual à pureza. De acordo com essa interpretação, tohora aqui deve ser traduzida como “purificação”. Assim, demei tohora pode ser traduzido como “purificação do sangue” e entendido como um “ritual de transformação”, um processo durante o qual uma mulher gradualmente passa da impureza para a pureza à medida que sua descarga de sangue diminui” como propõe a acadêmica Dra. Tamar Kamionkowski.[i]


Dar à luz uma criança é um momento religioso, mágico. Um momento em que as possibilidades de vida e morte se encontram. Um esforço corporal e emocional gigantesco. Após este encontro, surge uma nova mulher, uma mãe, que precisa restabelecer relações antigas, e estabelecer novas relações. Este é o período de demei tohora, o período em que a mulher, modificada pela maternidade, se reencontra, reencontra seu marido e relacionamentos anteriores e, principalmente, estabelece o vínculo com seu filho ou sua filha. Desta maneira podemos entender o período de demei tohora não como um período de impureza, mas um período de reconexão da mulher com ela mesma, e de retorno a sua própria vida.


Como explica a acadêmica Dra. Kristine Henriksen Garroway[ii], “uma mulher ser impura durante todo o seu sangramento pós-parto, é representativo da maneira como muitas sociedades do antigo Oriente Próximo analisavam o mundo: o sangue tem poder e precisa ser controlado. Além disso, o uso de rituais, como oferecer um sacrifício, para ajudar a pessoa a passar de um estado de impureza para um estado de pureza também é comum nos ritos do Oriente Próximo e é uma característica proeminente da lei sacerdotal em Levítico.”


No processo de retorno da mulher ao seu estado de pureza, ou ao seu próprio ser, nos deparamos com dois rituais. O primeiro, o brit milá, que interrompe mais cedo o primeiro nível de impureza pós-parto quando nasce um menino, sem menção a uma cerimônia para a menina. O segundo, o korban oferecido para marcar o encerramento do período de impureza, independente do sexo da criança. A importância de um ritual para marcar momentos importantes e mudanças radicais em nossas vidas torna-se clara nesta passagem.


Modernamente, marcamos o nascimento de uma menina, de maneira judaica, de diversas formas. Nas comunidades igualitárias através de uma cerimônia de Simchat bat ou Brit bat. Já a marcação do final deste período pós-parto, de retorno da mulher para ela mesma deixou de ser marcado nas comunidades igualitárias, tendo sido recentemente resgatado por algumas comunidades e chavurot, através da utilização da mikve. A imersão na mikve propõe um retorno às sensações do útero, um retorno à nossa fonte e um ato de renovação. Retornamos a quem fomos, para sairmos renovadas para este novo “eu” pós-parto.


A rabina francesa Pauline Bebe vai além: “Quando se mergulha na mikve, os vínculos com a Criação e com nossa espiritualidade se estendem ainda mais. Quando nos lembramos de que fomos criados à imagem de Deus, a mikve se torna um lembrete do infinito dentro do finito, do imortal dentro do humano, das opções ilimitadas oferecidas à humanidade.”[iii]


Tazria relaciona vida e morte, certeza e incerteza, presença e ausência. Mostra a necessidade de rituais, novos e antigos, para marcar os momentos especiais da vida. A parashá desta semana nos lembra que mesmo que tenhamos a capacidade de gerar sementes e frutos, de criar vida e dar à luz, que configuram a habilidade mais perto do divino concedida ao ser humano, precisamos ter consciência de nossa humanidade, de nossas limitações e finitude. Esta semana, neste Shabat haChodesh, somos convidados a marcar os tempos, viver os momentos, voltar à nossa origem para então seguir em frente.


Shabat Shalom.


[i] https://www.thetorah.com/article/postpartum-bloods-of-purity [ii] https://www.thetorah.com/article/gendering-a-child-with-ritual [iii] https://www.myjewishlearning.com/article/reinterpreting-the-mikveh

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