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Foto do escritorAndrea Kulikovsky

Parashat Metsorá - Vaicrá 14:1 – 15:33

Nesta porção da Torá, Deus descreve o ritual de purificação para pessoas e lares afligidos por tsaraat. Deus também instrui Moshé e Aharon sobre as leis da emissão de fluidos corporais.


A fala desempenha um papel importante em relação à infecção por tsaraat. Quando a tsaraat afligia a casa, o dono desta deveria procurar o sacerdote para contar sobre o problema. Por outro lado, de acordo com nossos Sábios, a tsaraat afligia aqueles que se envolviam em lashon hará. Eles acrescentam que, ao contrário de uma mão, que pode matar apenas aqueles que estão à distância de um braço, uma língua é como uma flecha que é disparada de um arco e pode matar a grande distância. O discurso maldoso pode prejudicar até mesmo aqueles que não estão nas proximidades, porque a fofoca viaja rapidamente. Da mesma forma, o discurso maligno também traz consigo um elemento de irreversibilidade, porque as palavras, uma vez ditas, nunca podem ser totalmente retratadas.


O sacrifício para iniciar a cura de tsaraat e expiar o lashon hara necessitava de: “Dois pássaros vivos e limpos, uma vara de cedro e uma tira de lã carmesim e hissopo”. Rashi, o comentarista bíblico francês do século 11, detalha o significado de cada um desses elementos[i]. Ele explica que os pássaros são oferecidos ritualmente porque eles constantemente gorjeiam e gorjeiam, criando sons como a tagarelice de lashon hara. A vara de cedro é usada porque as árvores de cedro são altas, simbolizando arrogância e ego, que muitas vezes alimentam nosso discurso crítico e ofensivo. A lã carmesim parece uma língua, que é a ferramenta física dada por Deus através da qual falamos, às vezes para o bem e às vezes para o mal. E o despretensioso hissopo representa a necessidade de humildade na eliminação da arrogância.


Os sábios advertem que falar mal é tão perigoso que não se deve nem falar bem de outra pessoa na presença de outras, porque ao falar sobre sua bondade, pode-se levar a falar dessa pessoa de maneira depreciativa. Mesmo quando fazemos elogios a alguém, corremos o risco de falar mal dele porque o abrimos para críticas. Melhor não falar sobre outras pessoas.


A pessoa que falou lashon hara e agora tem tzaraat deve se separar da tagarelice; deve identificar a arrogância e o ego; deve cultivar a humildade e a flexibilidade. E para isto, ela é separada do acampamento, ou, em uma expressão dos dias de hoje, ela é cancelada.


Sobre a infecção por tsaraat na casa, o comentarista espanhol do século XII Ibn Ezra ensina que “é uma mitsvá vir ao kohen”. A mitsvá começa no momento em que uma pessoa identifica uma potencial interseção entre sua vida pessoal e o mundo religioso mais amplo, mesmo que haja alguma incerteza. Se pensarmos na halachá como uma ponte entre nossas vidas e a vontade divina, vemos nesta passagem que esse encontro está enraizado em nossas experiências subjetivas e cresce a partir de nossa decisão de ir em direção a Deus. O sistema haláchico, em sua essência não é realmente sobre obedecer à autoridade religiosa, é sobre reivindicar a agência e tomar a iniciativa de enquadrar sua vida através dos ensinamentos e caminhos da Torá.


A halachá é a narrativa que abre o caminho para encontrarmos nossa própria voz – ter a confiança para perceber e articular nossas experiências pessoais e ter a humildade de chegar a uma conclusão sobre como isso interage com um caminho religioso. O encontro entre um indivíduo e a ampla e profunda sabedoria da Torá deve dignificar – ao invés de eclipsar – a pessoa e sua história. Ao entrarmos nesta temporada de Pessach, podemos mergulhar neste trabalho de “Hagadá” – narrando as histórias de nossas próprias vidas. Podemos refletir em como e com quais intenções narramos nossas histórias e as histórias dos outros.


Pensando que Deus criou o mundo com palavras, devemos ter consciência do poder que elas têm de construir ou destruir, e que, uma vez soltas no ar, elas iniciam sua cadeia de impacto, sem a possibilidade de voltar para trás. Que possamos então emitir palavras de construção e contar histórias maravilhosas.


Shabat Shalom



[i] Rashi sobre Levítico 14:4

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