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Parashat Ki Tissá - Shemot 30:11-34:35

Ki Tissá é uma parashá intrigante. Começa com a contagem do povo – em verdade, dos homens em idade de ir para a guerra – através do meio shekel. Passa pelos detalhes do Tabernáculo relativos aos sacerdotes, e destaca os artesãos que serão responsáveis pelos trabalhos da construção: Bezalel e Oliav, juntamente com todos aqueles que forem abençoados com aptidões especiais. Então, Aharon ajuda o povo a construir o bezerro de ouro, um ídolo! O povo faz um festival para este ídolo, e quando Moshé volta fica absolutamente irado com o que vê, quebra as Tábuas da Lei. Aharon lava suas mãos da responsabilidade pelo erro cometido. Moshé convence Deus a dar uma segunda chance ao povo, e um segundo jogo de Tábuas da Lei é confeccionado. Moshé volta iluminado por seu encontro com Deus, quando os 13 Atributos Divinos são declarados. Muitas reviravoltas! Altos e baixos, ira e brilho.


Essa semana marcou o Dia Internacional das Mulheres. E a parashá da semana quase não fala sobre mulheres. Fala indiretamente em dois momentos. No primeiro, Aharon manda os homens retirarem as joias de suas esposas, filhos e filhas para construção do Bezerro de Ouro; no segundo traz a proibição acerca do casamento de homens israelitas com mulheres canaanitas.


Com minha energia focada nos questionamentos trazidos pelo Dia Internacional das Mulheres, um dia de luta, de conscientização de que ainda há muito para mudar neste mundo para que sejamos realmente tratadas de maneira igualitária, a reação de Aharon e falta de punição por seu erro gritam em meus ouvidos. Por muito menos Miriam foi excluída do grupo e punida com uma inexplicável descamação na pele. Mas Aharon conta sua história dizendo que o povo é ruim, pediu para ele fazer um ídolo, e o ídolo praticamente se fez sozinho: “Então eu disse a eles: 'Quem tem ouro, tire-o!' Eles me deram e eu joguei no fogo e saiu este bezerro!”[i]. Mas nós lemos o texto anterior, e não é assim que o episódio está descrito. Onde está a responsabilidade de Aharon? Qual é a mensagem que esta passagem nos ensina, ainda mais quando sobrepomos esta narrativa com a da punição de Miriam?


O segundo aspecto que me incomoda nesta parashá é a lenda que foi criada pela literatura rabínica de que as mulheres não deram seu ouro para a construção do bezerro. De uma maneira invertida, um conceito absolutamente machista cria uma saída para as mulheres, na qual nos apoiamos até hoje. No entanto, a história rabínica não condiz com o que está no texto bíblico.


“E todo o povo tirou as argolas de ouro que estavam em suas orelhas e as trouxe a Aharon”.[ii] Conforme ressalta a Professora Elise R. Stern em seu comentário para “The Torah, A Women’s Commentary”, esta frase implica que todos, não somente os homens, contribuíram para a construção do Bezerro de Ouro. No entanto, Rashi comenta: “Aharon disse para si mesmo: mulheres e crianças amam seus ornamentos; talvez o assunto seja adiado porque eles hesitarão em dar seus ornamentos e, nesse meio tempo, Moshé pode chegar. Eles (os homens), porém, não esperaram até que as mulheres e crianças se decidissem, mas tiraram os enfeites eles mesmos.”. Esta interpretação é alinhada ao Midrash Pirkei d’Rabbi Eliezer, que diz que somente os homens contribuíram para a construção do bezerro, e por isto as mulheres foram presenteadas neste mundo com privilégios especiais em Rosh Chodesh, e no mundo vindouro.


O mito que conecta as mulheres a Rosh Chodesh então, vem de um preconceito masculino de que as mulheres são apegadas aos seus ornamentos, que são vaidosas, não algum mérito especial. No entanto, Rosh Chodesh passou a ser o marco do movimento feminista pela igualdade da mulher no judaísmo. A Professora Norma Joseph ressalta a importância deste dia como marco, por ser uma festividade já reconhecida pela halachá tradicional, que precisava ser somente ressignificada.


“Mulheres judias já provaram há muito tempo sua teimosa lealdade a Deus” declara a Doutora Ellen Frankel. Apesar de não concordar que esta teimosa lealdade e proximidade possa ser extraída do episódio do Bezerro de Ouro, concordo com a afirmação. Fomos líderes, juízas, profetizas, feiticeiras. Estivemos sempre ligadas a esta conexão próxima e pessoal com o Divino. Criamos a vida em nosso ventre, produzimos alimento, e assim, participamos ativamente na continuidade da criação.


Proponho então que não usemos Rosh Chodesh como um marco do feminino no judaísmo por conta da narrativa da parashá Ki Tissá, mas por conta de nossa relação intrínseca com a lua e suas fases. Por conta da relação da Lua com o aspecto feminino de Deus, a Shechiná, como propõe o Zohar. Proponho que nós, mulheres, busquemos a força de todas as fases da lua, e de todas as mulheres em nossa volta que nos inspirem a sermos profetisas, feiticeiras, juízas, ou líderes de qualquer outra forma que quisermos ser.


Que neste shabat possamos nos conectar e rezar para a Shechiná.

Que Ela te abençoe e que Ela te guarde

E enquanto ela brilhar seu rosto, que você possa incorporar a graça

Que Ela te abençoe e que Ela te guarde

E enquanto Ela trouxer libertação, que você possa incorporar a paz[iii]


Shabat Shalom!



[i] Shemot 32:24 [ii] Shemot 32:3 [iii] Kohenet Hebrew Priestess Institute

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