top of page

Parashat Ki Tavô - Devarim 26:01-29:08

Em Ki Tavô, Moisés instrui os israelitas a respeito da primeira oferta de frutas. Moisés, então, relaciona as bênçãos que o povo terá se guardar os mandamentos e as punições que sofrerá por desobedecê-los. São 54 versículos, 98 maldições! É conhecida como uma das duas parashot de tochechá [repreensão], sendo a outra Bechukotai.


É difícil não comentar acerca das maldições elencadas, uma vez que elas afirmam que morte, doença, destruição, canibalismo, servidão, sobreviver aos filhos, pestilência e sofrimento incalculável certamente descerão sobre nós se não ouvirmos a Deus e obedecermos às mitsvót. Em especial uma passagem me dói na alma: “você comerá sua própria geração, a carne de seus filhos e filhas” “a placenta que sai entre suas pernas e os bebês que ela carrega; ela os comerá secretamente, por causa da necessidade absoluta, na situação desesperadora a que seu inimigo os reduzirá em suas cidades.” Esta dor e desespero é inimaginável. Pior ainda é o pensamento de que tal sofrimento seria infligido por culpa das próprias vítimas desta dor tão imensurável. Muitas pessoas acreditaram e ainda acreditam nesta forma de recompensa e punição - em um Deus poderoso, terrível e aterrorizante.


O rabino americano Yitz Greenberg escreveu: “Após o Holocausto, vimos que a história judaica não poderia mais estar sob o signo da tochechá. ... Para mim, o encontro com este acontecimento horrível foi o momento em que entendi definitivamente que não havia pecado pelo qual isso pudesse ser um castigo divino. No mesmo sentido, o gueto de isolamento total, terror e fome, as deportações e torturas sem fim, a humilhação e degradação ilimitadas - nada disso pode ser explicado como punição pelo pecado que qualquer Deus que eu pudesse adorar ou amar possa impor.”


O que devemos fazer com esta passagem extraordinariamente poderosa e perturbadora, indicando as punições mais severas imagináveis para os judeus que deixam de cumprir sua parte do pacto observando todos os mandamentos? Certamente não aceitamos a crença ortodoxa fundamentalista de que cada palavra nesta passagem reflete a revelação literal de Deus. Um Deus que poderia orquestrar esses terrores naturais e históricos horríveis como punição por não comer comida kosher ou mesmo deixar de fazer caridade aos pobres é um Deus a quem podemos adorar?


A pouco mais de uma semana de Rosh Hashaná somos apresentados a este difícil texto bíblico. Somos levados a questionar como é nosso Deus. Seria Ele o Deus da recompensa ou da bondade e compaixão?


Passamos pela vida com bênçãos e maldições. Às vezes as maldições apagam as bênçãos e às vezes as bênçãos brilham com uma luz tão intensa que as maldições parecem diminuir e desaparecer. Mas as bênçãos e as maldições estão sempre presentes. Essa é a nossa verdade existencial. E o que nos ajuda a manter o equilíbrio é o conhecimento da presença amorosa de Deus em nossas vidas e a força que derivamos desse amor.


Em nossa busca pelo Divino em nossas vidas, podemos entender que nosso Deus não "se deleitaria em fazer você perecer e exterminá-lo"[i]. Nosso Deus não é o guerreiro feroz e vingativo da maldição. Deus nutre, ama e perdoa, nos dá força e esperança e nos permite contar nossos dias, bem como nossas bênçãos. “Seus caminhos são agradáveis, suas veredas são pacíficas”[ii] como canta o salmista.


Que possamos nos manter atentos a nossos atos, em busca da construção de um mundo melhor, guiado pelos ensinamentos da Torá que nos ensina a importância dos atos de bondade, compaixão, cuidado com o próximo, defesa do fragilizado. Que possamos estar cientes da possibilidade de momentos difíceis em nossas vidas, e que eles não são resultado do cumprimento ou não de mitsvót, eles fazem parte dos altos e baixos da própria vida. Mas que, principalmente, possamos contar nossas bênçãos, reconhecer nossos momentos de alegria, e ter uma relação de amor verdadeiro, de conforto e esperança com Deus e com as manifestações Divinas em nossas vidas.


Shabat Shalom.


[i] Devarim 28:63 [ii] Mishlêi 3:17

28 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page