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Parashat Chukat - Bamidbar 19:1-22:1

A parashá desta semana inicia com a famosa e enigmática cerimônia da vaca vermelha, que é oferecida como uma oferta de purificação que, neste caso, descontamina a impureza da morte. O sangue - que é o portador da vida - é o que descontamina da impureza da morte, tornando possível que esta pessoa volte aos seus atos cotidianos, e sua vida espiritual plena. De acordo com o rabino Yitz Greenberg “Em linguagem simbólica, esta é a mensagem repetida e fundamental de nossa tradição, que o humano deve se livrar da morte e agir, trabalhar e viver do lado da vida e na criação de vida no mundo”.[i]


De maneira intrigante, logo em seguida, o texto bíblico informa acerca da morte de Miriam. De maneira direta e sem emoção: “E morreu Miriam lá e foi enterrada lá.”[ii]. O texto bíblico não fala do luto por Miriam, a profetisa, que era responsável pela água do povo, que cantava, dançava, tocava tamborins e liderava. Miriam, que ajudou a salvar a vida do irmão e teve tantos outros papéis importantes, simplesmente se vai. “E a comunidade estava sem água” é a próxima frase do texto bíblico.


A rabina Audrey Pollak ensina que “há uma ligação direta entre a falta de luto pela morte de Miriam e a falta de água: “Na verdade, porque eles não derramaram lágrimas pela perda de Miriam, a fonte de sua água secou, pois era como se o mérito dela não importasse para eles.” A comparação da falta de lágrimas do povo, as bochechas estavam secas, com a declaração “a comunidade estava sem água” dá um significado mais profundo à passagem.”[iii]


Então, o povo procura Moshé e Aharon para resolverem o problema de água. É possível imaginar o quão profundamente abalados eles estavam com a perda de sua irmã, e essa pode ter sido a razão de Moisés ter reagido com tanta raiva ao bater na rocha, em vez de falar com ela, como Deus ordenou. “Em luto misturado com raiva - uma reação tão normal - Moisés atacou a rocha para produzir o que Miriam poderia ter produzido apenas com sua presença.”[iv]


Sempre penso em como o judaísmo é uma tradição inteligente no que tange o luto: por uma semana você se senta, sente o luto, sofre, se separa do dia a dia. Por um mês carrega a dor, e inicia seus passos. Por quase um ano lembramos diariamente daquela pessoa que perdemos. Então, seguimos a vida, porque já choramos, já sentimos, já lembramos, e agora carregamos as lembranças, mantemos a memória viva através dos ensinamentos daquela pessoa em vida. No entanto, se não nos deixamos viver o luto em todas as suas fases, ele vira uma ferida que não se cura, a dor da perda se torna um fardo.


Neste momento, Moshé e Aharon são informados de que não entrarão na Terra prometida. Aharon é chamado a passar suas vestes para seu filho, e morre no monte Hor. Para Aharon há luto, a comunidade chora por 30 dias. Então, a jornada continua.


“Parashat Chukat é sobre a morte de uma geração e seus líderes. Miriam e Aharon morrem, e Moshe é informado por Deus que ele também morrerá antes de entrar na terra prometida. Além disso, o Midrash relata que, no momento em que os israelitas chegam ao deserto de Zin, no início da parashah, toda a geração que estava destinada a morrer no deserto foi substituída” é o que ressalta a acadêmica Ilana Kurshan. Percebemos então que o povo, que no início reclamava a falta de água, agora cava um poço e canta em agradecimento por seu feito: “Brota, ó poço - cante para ele - O poço que os chefes cavaram, Que os nobres do povo começaram com varas, com seus próprios cajados.” Talvez Miriam tenha ensinado o povo de Israel a cavar seus poços, a buscar a água por si mesmos, e seus ensinamentos então, tenham garantido a sobrevivência do povo, e a manutenção da memória de Miriam viva até os dias de hoje.


Nas duas pontas da jornada, saindo do Egito e entrando em Israel, a água representa a continuidade da vida e a transição. À medida que esta nova geração continua sua jornada através do deserto em direção à Terra Prometida, a Torá -fonte de vida- permitirá ao povo encontrar e cantar sua própria canção. Essas águas são um elemento de transição da morte para a vida, à medida que nosso povo deixa de vagar pelo deserto e passa a viver como o povo eterno de Deus na terra que nos foi prometida pelo mérito de nossos ancestrais, tanto mulheres quanto homens.


Para mim, Chukat traz a lição da importância de lidar com a perda. Devemos viver o luto, com toda a sua dor. Devemos trazer às nossas mentes as vivências e lições que recebemos durante a vida daqueles que se foram, mesmo que no início elas tragam mais saudade do que consolo, para que possamos, quando a dor diminuir, viver estas lições e continuar a construção do legado, em busca de água e de vida na nossa Terra Prometida.


Shabat Shalom.



[i] https://www.hadar.org/torah-collection/yitz-greenbergs-divrei-torah [ii] Bamidbar 20:1 [iii] Rabbi Elyse Goldstein. The Women's Torah Commentary. Turner Publishing Company. [iv] The Women's Torah Commentary

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