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Mishpatim

A parashá desta semana, Mishpatim, fala de regras de convivência comunitária, relação com escravos e relação do povo com Deus. Muita discussão é feita sobre a imputabilidade às mulheres de várias das regras descritas em Mishpatim, pela conjugação masculina dos verbos. A questão é muito bem explicada pela acadêmica Rachel Adler sobre a utilização do masculino como plural geral na língua hebraica. Seriam então exclusivas ao homem as regras que claramente são inerentes ao gênero.


No entanto, para mim, a parashá é de difícil leitura não por este motivo, mas pela relação do texto com as mulheres, em especial no que tange as escravas. Sim, o povo judeu, liberado da escravidão, possuía escravos – o que já causa estranhamento. Mas esta era a forma que a sociedade funcionava, e a lei judaica previa descanso semanal e liberação após 7 anos (só do escravo homem judeu...) o que era um avanço para a época.


Já a mulher tem questões completamente diferentes. Em Êxodos a previsão de venda de uma mulher (menina) como escrava – por seus pais - é para que ela se torne esposa (mesmo que segunda ou terceira esposa) de seu amo. Então, na realidade, ela nunca mais seria liberada de seu cativeiro sexual. A não ser que o amo ou seu filho não se agradassem dela, o que a faria ser liberada e não revendida. Quando um homem casasse com mais de uma escrava, ele deveria suprir para todas as suas “escravas-esposas” comida, roupas e “direitos conjugais” (estes últimos entendidos como sexo, por alguns estudiosos).


Quando a um homem escravo era dada uma escrava para se casar (no caso a função era reproduzir), esta escrava não era uma judia, e, portanto, não teria os direitos de se casar com seu amo judeu ou mesmo de ser liberada. Ela era um bem material, uma fêmea dada à reprodução, que produzia crianças escravas para seu amo. No caso deste homem escravo estar em tempo de ser liberado do seu cativeiro (após 7 anos, de acordo com a lei), ele não poderia levá-la como esposa, e para mantê-la precisaria então abrir mão de seu direito de ser liberto. Passaria a ser cativo para o resto da vida: ele, ela e seus filhos.


Hoje, aos olhos de uma mulher brasileira, livre e educada, a leitura destes versículos relativos à escravidão feminina é árdua. Difícil ouvir a objetificação tão clara de sua semelhante sem um friozinho na espinha. Mais triste ainda é o fato de que esta ainda é a realidade de milhares de mulheres no mundo, inclusive no nosso país. A prostituição infantil nada mais é do que a expressão moderna desta questão. Há países da África e Ásia em que a venda de meninas para o casamento com homens velhos, com poder aquisitivo para comprar uma nova esposa, é ainda uma prática existente, comum e aceita socialmente.


Precisamos ler o texto, sentir a dor das palavras e pensar em maneiras de agirmos. Há ONGs e movimentos aos quais podemos nos associar para lutar por uma vida mais digna para as meninas do mundo. Sintamos esta dor; é hora de reagir.

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