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Judeus e o Natal

Na parashá que lemos esta semana, Shemot, os israelitas estão vivendo em Goshem, Mitsraim. Fora de sua terra natal, eles são vistos como estranhos, geram o medo e são escravizados. Então somos apresentados à história de Moshé, o menino israelita, cuja vida é salva por uma série de mulheres: as parteiras, sua mãe, sua irmã e a filha do Faraó, que o tira da água do rio para cria-lo como filho. Shemot também é sobre a identidade de Moshé, ou suas várias identidades, e como ele finalmente se identifica como israelita, mais especificamente, o líder dos israelitas.


De todos os dias do ano, os dias 24 e 25 de dezembro são os mais marcantes da vida da comunidade judaica fora de Israel. É o momento em que somos inundados com a certeza de que somos um povo dentro de uma sociedade maior.


Durante séculos, os judeus da Europa Central e Oriental temeram a época do Natal, particularmente marcada por pogroms – atos de perseguição à comunidade judaica. Assim, no século XVII, uma nova tradição foi instituída: Nittel Nacht, ou Noite do Nascimento, comemorada com (entre outras coisas) a prática de não aprender Torá até tarde da noite, que era substituída pela prática comunitária ou familiar de jogos como xadrez.


Na Europa Ocidental, os símbolos festivos - como a árvore de Natal - significavam inclusão secular na sociedade. Judeus alemães abastados costumavam posar para retratos com suas famílias em frente a árvores de Natal decoradas, um ato também praticado por celebridades como o pai do sionismo moderno, Theodor Herzl e o grande estudioso do misticismo judaico, Gershom Scholem.


Na década de 1870, o Natal nos Estados Unidos começou a mudar de um feriado essencialmente religioso para um secular - um processo acelerado pela comercialização e pelo costume de se trocar presentes. A comunidade judaica começou a absorver alguns destes costumes, como a troca de presentes e a decoração de árvores. O costume mais específico da comunidade judaica dos Estados Unidos, marcante até os dias de hoje e nascido na cidade de New York, é comer comida chinesa, ou pedir delivery de comida chinesa na noite de Natal.


No Brasil hoje, o Natal ainda é um feriado bastante ligado à religião católica, mas também intrínseco à vida social de nosso país. Quantos de nós já não precisamos explicar para nossos filhos, sobrinhos ou netos sobre os motivos de não celebrarmos Natal, sobre a ausência da árvore decorada em casa ou sobre o Papai Noel? Eu mesma fui chamada na escola do meu filho, por conta do bom velhinho!


Diversas famílias de nossa comunidade equilibram a realidade em que mais de uma fé convive no meio familiar ou no cerco próximo de amigos. Aparecem então muitas oportunidades de compartilhar a beleza de diferentes tradições de fé que podem existir em uma família, que nos oferecem a possibilidade de ensinar o ideal judaico sobre o amor à família e como os relacionamentos saudáveis com a família podem ser maravilhosos quando honrados de ambos os lados.


O Natal é um momento especialmente delicado para aqueles que escolheram o judaísmo, e que tanto enriquecem a nossa comunidade. É o momento em que a escolha espiritual pessoal pesa diante do encontro com a família, a tradição, as lembranças do passado. A escritora Andi Rosenthal, conta sobre o primeiro natal dela após sua conversão, fala com emoção de como se sentiu diante de sua família, e como ainda se sente hoje: “Para a maior parte do mundo, o Natal é o dia do nascimento. Mas percebo que, para mim, é um yahrzeit, aniversário de uma morte. Espero que, como acontece com qualquer perda, a dor se torne mais suave a cada ano que passa e que eu me lembre do que aprendi na minha antiga vida com um respeito e carinho genuínos pelo que fui.”


Existem diversos aspectos absolutamente judaicos, vinculados ao Natal. O olhar atento e o abraço acolhedor para nossos congregantes que escolheram o judaísmo, afirmando a beleza e a importância da diversidade e do novo olhar que eles trazem a nossa comunidade. O apoio a famílias que lidam com a diversidade dentro de suas casas. O envolvimento com amigos nos juntando à felicidade deles em suas celebrações, assim como, muitas vezes, eles se juntam em nossas celebrações, construindo assim um ambiente de convivência, respeito e paz. Mas em especial, o Tikun Olam, para a grande sociedade que nos rodeia.


Hoje, milhares e milhares de judeus praticam o voluntariado em cozinhas populares e hospitais, visitam famílias, preparam ou entregam refeições de Natal, compram presentes de Natal para os menos favorecidos ou substituem colegas de trabalho em plantões. Cada vez mais, o voluntariado se tornou um meio estabelecido de combinar o valor judaico do tikun olam, reparar o mundo, com a mensagem de Natal de trazer alegria ao mundo.


Escolher a identidade israelita, agir e liderar de acordo com ela é a escolha de Moshé na parashá desta semana. O Natal é o momento do ano em que nós, judeus, somos convidados a reiterarmos nossa identidade judaica; em que somos apresentados com a oportunidade de aplicar nossos valores judaicos em situações alheias ao judaísmo; em que somos abençoados com a possibilidade de trazer apoio, luz e alegria de maneira extremamente judaica, àqueles que nos rodeiam.


Shabat Shalom.




Foto: Santa Rick Rosenthal

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