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Bamidbar - Bamidbar 1:1 – 4:20

Nesta porção da Torá, Deus diz a Moshe para realizar um censo de todos os homens israelitas com idade superior a 20. Cada tribo recebe lugares específicos no acampamento ao redor do Tabernáculo. Os filhos de Levi são contados e suas responsabilidades são estabelecidas. Um censo dos primogênitos do sexo masculino é feito e um imposto especial de resgate é cobrado sobre eles.


“Então Moisés e Arão tomaram aqueles homens, que foram designados por nome, e no primeiro dia do segundo mês eles convocaram toda a comunidade, que foi registrada pelos clãs de suas casas ancestrais, os nomes dos que tinham vinte anos ou mais de idade foram listados, cabeça a cabeça. Como Adonai havia ordenado a Moisés, assim ele os registrou no deserto do Sinai.”[i]


Deus ordenou a Moisés que fizesse um censo dos israelitas pouco antes da construção do Tabernáculo[ii], o que foi realizado[iii]. Isto foi apenas um mês antes deste censo ser ordenado. Por que Deus precisa que as pessoas sejam contadas com tanta frequência?


“No censo antes do Tabernáculo, o povo foi contado como uma nação. Neste censo, eles são contados dentro de suas tribos... É muito fácil transformar seres humanos em estatísticas. Na história recente, os nazistas tentaram desumanizar os judeus substituindo seus nomes por números.” Ressalta a rabina Leslie Bergson. Então, por que contar tanto um povo que havia acabado de sair da escravidão, onde eles não passavam de números, sem identidade?


Rashi, comentarista Francês, explica: “Porque eles eram queridos por Deus, Deus os conta o tempo todo – quando eles saíram do Egito, Deus os contou; quando muitos deles caíram por terem adorado o bezerro de ouro, Deus os contou para verificar quantos restaram, quando a Shechiná (presença divina) estava prestes a habitar entre eles, Deus novamente fez seu censo, pois no primeiro dia de Nissan o Tabernáculo foi erguido e, pouco depois, no primeiro dia de Iar, Deus os contou”.


O neto de Rashi, Rashbam, apresenta uma razão mais prática. O primeiro censo foi para permitir que as pessoas fizessem a contribuição de meio shekel para o Santuário. Neste censo, o povo está preparando a campanha militar para tomar a terra e o objetivo deste censo era contar os homens com idade superior a 20 para o serviço militar.


Já o sábio espanhol Nahmânides menciona essas duas razões e acrescenta que, desta vez, as pessoas são contadas por seus nomes, e o censo dá a cada membro da nação a chance de se apresentar diante de Moshé e Aharon e ser reconhecido como um indivíduo de valor pessoal.


Desta forma, podemos pensar que, recém saídos da escravidão, a contagem do povo deveria ser feita para saber, em termos gerais, quantos haviam sobrevivido até aquele momento. Como quando fazemos um passeio em grupo, e contamos todos os que estão, antes do ônibus sair. Esta é a contagem do meio shekel, onde todos contam o mesmo valor. Uma vez recebidos os mandamentos, e estabelecidos como povo, prontos para seguir a caminhada, é preciso reconhecer grupos, famílias, individualidades.


No entanto, a chazanit Rachel Spilker nos traz uma provocação importante: “No texto, Moshé é instruído a registrar kol adat b’nei yisrael, literalmente “toda a comunidade dos Filhos de Israel”. Mas os homens aptos com mais de 20 anos representam toda a comunidade? Embora adat seja frequentemente traduzido como “comunidade”, também pode se referir a uma “assembléia, banda, empresa ou facção”, portanto, apenas um segmento da população maior. Essa nuance nos permite reconhecer todos os que não são contados: mulheres, menores, idosos e deficientes físicos, mentais ou emocionais. Na Torá, essas pessoas geralmente estão ausentes das contagens e das narrativas. Aqueles que são contados têm um valor especial para a sociedade, enquanto aqueles que não são podem ser considerados menos valiosos e, portanto, menos visíveis. Em Bamidbar, pode-se argumentar que o número de tropas é o que realmente conta, já que são as que estão incluídas no censo. Mas quando lemos nas entrelinhas, quando perguntamos quem não está incluído, podemos ver como as histórias não contadas das pessoas não mencionadas também importam.”


Ontem falei de Sally Priesand, primeira rabina oficialmente ordenada na história do judaísmo, cujo aniversário de 50 anos de ordenação celebramos ontem. Mas não falei de Regina Jonas, a primeira rabina ordenada de fato, cuja ordenação e trabalho foram apagados nas câmaras de gás de Terezin, e no silêncio de seus colegas e contemporâneos.


Todo censo tem um recorte, e todo recorte exclui alguém da narrativa. Bamidbar vem nos lembrar que, enquanto comunidade devemos nos esforçar em contar cada um, com seu nome e sua individualidade, em sua tribo e suas histórias, organizado dentro do todo de nossa comunidade, com um espaço real de pertencimento, reconhecimento e participação. Cada pessoa importa em nosso espaço sagrado.


Shabat Shalom.


[i] Bamidbar 1:17-19 [ii] Shemot 30:11-16 [iii] Shemot 38-25-6

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